13 dezembro, 2013

Vago



Copos. Sempre quebro copos. Quase todos os dias. Costumo sempre deixá-lo sobre a escrivaninha, junto de algumas folhinhas de rascunho e uma caneca d’água. Sou canhoto e costumo deixar o copo ao lado de meu braço esquerdo. Quinze segundos e eu já esqueço que o pobre coitado está lá, e levanto o braço para coçar a cabeça, esbarrando no copo que se espatifa pelo chão. Copo, para mim, é sinônimo de ideia nova. Sempre que tenho alguma ideia nova, coço a cabeça. Mania normal demais para alguém nem tão normal assim. Imagine só, quantos copos eu já quebrei nessa vida? Na maioria das vezes o copo está cheio de água, que de tanto que espera para ser bebida, só falta evaporar. Às vezes penso que sou maldoso demais com os copos, não só por viver quebrando-os, mas sim por esquecê-los, mesmo eles ali, ao meu lado, ao lado da mão esquerda que escreve a esmo. Costumamos desprezar coisas que estão tão perto da gente, não é? Os copos lá, se quebrando, e eu sempre indiferente. Confesso que, nas primeiras vezes, até me surpreendia com meu excesso de distração, mas depois se tornou normal. Vou me conhecendo mais a cada copo que se quebra. Acho que é assim na vida também. Algo por perto querendo nos chamar a atenção, e a gente valoriza mais o que está longe, inacessível. O simples aos nossos olhos e a gente querendo enxergar o que não precisa. Pois é, preciso dar mais valor aos copos. Eles estão sempre ao meu lado e eu vivo quebrando-os. Faz parte. Eles se quebram enquanto junto os cacos em minha mente. E quem junta os cacos dos copos? Sim, sou eu, tentando reparar meu erro de desvalorizar o que esteve sempre ao meu lado.



[...]

09 dezembro, 2013

Rente...

Vivemos, vencemos e perdemos
Enquanto ela presencia tudo
Rente a todos
Duramente necessária
A mãe da honra
Dela, se enxerga
Ela é livre, e não menos esclarecedora.

30 novembro, 2013

Música

Certas músicas me lembram momentos.
Momentos que só não estão mortos
Ou soltos ao relento
Porque a música continua
Ela sempre continua

Certas pessoas me lembram momentos
Pessoas que só continuam presentes
Mesmo estando ausentes
Porque a música continua
Ela sempre continua

Certas cidades me lembram momentos
Cidades que cabem em minha mente
E só continuo correndo pelas ruas delas
Porque a música continua
Ela sempre continua

Tudo me lembra música
Músicas me lembram momentos
Momentos me lembram pessoas
Pessoas me lembram cidades
Cidades me lembram mundo
E o mundo me lembra
Que tudo acaba
Momentos, pessoas...
Mas a música não
A música continua
Tudo fica pelo caminho
A música é a companheira do tempo
Tudo se acaba com o tempo
Menos a música

Ela sempre continua...

26 novembro, 2013

Tic-Tac



Trovões contínuos assustam aquela criança voltando da escola
Ela tem muito medo de trovões. Muito não, talvez o seu maior.
Mas algo fará ela superar este medo.
Para dar espaço a outros, ainda mais complicados
Ouço o tic-tac que não me deixa mentir...

Disfarces



     Um homem esbarrou em mim enquanto eu ia pagar algumas contas no centro da cidade. Ele parecia feliz, porém insatisfeito. Insatisfeito com o quê? Deu vontade de perguntar. Notamos facilmente quando alguém está insatisfeito, mesmo quando a insatisfação vem disfarçada de sorriso ou até uma gargalhada, principalmente hoje em dia, onde sarcasmo e ironia estão na boca de todos que não sabem ser sarcásticos ou irônicos. A insatisfação pode se disfarçar de palhaço, que abre um imenso sorriso à criança eufórica que está ali perto, mas que pode ter dentro de si próprio uma criança tão chorona quanto as que acabam de vir ao mundo. Irônico, não? O homem corria em direção ao banco que já estava por fechar. Não tinha necessidade de correr tanto assim, afinal, mal eram três e quarenta e cinco da tarde e o banco estava logo ali, há menos de um minuto andando tranquilamente. Deve ser um homem de negócios. Deve ser feliz, mesmo que sua felicidade possa ser a desgraça de outros bons corações por aí. Também penso no que pode ser a felicidade; talvez ela seja como os içás, que aparecem no verão e somem o resto do ano, ou também como as árvores, fortes e bonitas, aquelas poderiam durar cem, duzentos, trezentos anos, mas que de repente são derrubadas sem uma explicação convincente. Acredito que a tão desejada senhorita Felicidade tenha esses dois disfarces mesmo. Pode aparecer num verão qualquer e já sumir, ou pode parecer que vai durar para sempre e num piscar de olhos, tudo se passou.



     Felicidade ou não, insatisfação ou não. Tudo é tão relativo. Só de saber que aquele homem apressado – e aparentemente nervoso – é feliz, já me dá uma coceira na cabeça. Paguei minhas contas na avenida principal do centro da cidade e voltei pela mesma rua – a do banco – para comer um daqueles pastéis frios que foram rejeitados o dia inteiro encostados na estufa – afinal, o dinheiro era pouco, mais que nada – e tornei a ver aquele mesmo homem, só que entrando em seu carro que estava na zona azul – ainda parecia nervoso – e saindo, não com menos pressa de quando tinha ido ao banco, para algum lugar que não me interesso por saber. Será que felicidade é “isso”? Será que a senhorita Felicidade não passa de uma impostora, que nos ilude em nossos sonhos como uma princesa que nos encanta, e que na realidade se torna uma monstra e modifica completamente o nosso comportamento? O que percebo nessas pessoas que vejo e conheço por aí é que, quase todos acham que felicidade é “não ter problemas”, ou “nunca mais se estressar e viver em completa harmonia a vida toda”. Sim, felicidade pode ser isso, nos contos, nas fábulas, nas dissertações e em redações de vestibulares. A realidade é bem diferente disso tudo. Aquele homem – que parece ser homem de negócios – estava nervoso e apressado para resolver algo naquele banco, mas mesmo não expressando, ele devia estar satisfeito. Para quê sonhar a vida inteira com a tal “felicidade” e acordar talvez apenas no final? Felicidade é momento, uma eterna variante, satisfação é uma constante. A felicidade pode durar um segundo em uma vida inteira totalmente solitária e sem graça. Alguns dizem que vale a pena, eu já não sei. Acho que não vale. Acredito que a satisfação sim é algo que devemos ter como meta em nossas vidas. Independente de dinheiro, bens materiais ou vida social. Não há coisa melhor para cada um do que estarmos satisfeitos com nós mesmos. Isso, para mim, é a tão falada “felicidade”. Existe a senhorita Felicidade, a da ficção, a utópica, e a tão respeitada “senhora” Felicidade, a da realidade, a essencial, que não usa o nome “felicidade” por aí, ela prefere ser sincera com as pessoas que tentam conquistá-la. Ela prefere se chamar “satisfação pessoal”, ou “consciência tranquila”, e por que não se chamar também “verão”, ou “pequenos momentos para se recordar”? Bom, a “senhora” Felicidade tem mais disfarces que a insatisfação ou a utópica felicidade, mas os disfarces são acessíveis a todos.
     Me confundi no começo ao pensar em tudo isso por conta apenas de um simples acontecimento, mas logo me encontrei em meus vagos devaneios. Terminei o pastel, paguei a imensa conta no valor de dois reais e segui para casa – à pé e satisfeito – tentando enxergar mais alguns disfarces pelo caminho. Quem sabe acabo encontrando por aí, alguma felicidade disfarçada...

25 setembro, 2013

Olhos Cegos

Ei, consegue me enxergar?
Se sim, segure minha mão
Minhas lágrimas escorrem
Mas não vou enxugar
Só preciso de um pouco
De compreensão
Meus olhos são cegos
Minhas lágrimas não
Elas enxergam até mais
Que os olhos de qualquer um
Dizem que o céu é azul
O azul deve ser
Aquilo que senti
Ao levantar as mãos
Neste certo momento
Me senti sim, no céu

Ei, consegue dizer-me
A cor do sangue?
Dizem que é vermelho
Em um jogo de adivinhação
Em que eu era o único jogador
Conclui que o sangue
Tem a mesma cor
De minhas lágrimas
Pois ambas doem quando saem de mim
Por isso não as enxugo mais
Deixo escorrer
Para logo passar a dor
Será que minhas lágrimas
São Vermelhas?

Ei, consegue sonhar?
Dizem que as nuvens
Parecem algodões-doces
Será que é doce também?
Mais doce que
O lugar onde vivemos?
Acredito que sim, pois
Minha vida é amarga
O que adocica meus dias
São meus sonhos doces
Andando nas nuvens
Andar e correr
Sem precisar enxergar
Pois eu nunca mais
Iria cair
Confesso que também
Não sei o formato das nuvens
Mas se é doce como dizem
Pode largar minha mão
Que eu quero andar
Para sempre nelas...

04 setembro, 2013

Vamos conversar

A vida é muito mais
Que sofrer ao relento
Faça mais por merecer
A bela brisa do vento
Venha cá, vamos conversar!
O que fez hoje, além de trabalhar?
Que tal viver ao final do expediente?
Uma boa idéia, não acha?
Vamos lá, experimente!
Guarde a preocupação na gaveta
E vá à praça com seu filho
Sinta o ar puro, veja borboletas
Observe a paisagem, os trilhos
Andando de trem à esmo
Não tente ganhar a vida
Apenas vendo-a passar
Perca um pouco de tempo
Ganhando sorrisos
Ganhe um pouco de sossego
Perdendo o medo
De não render o suficiente
No difícil emprego
Venha cá, vamos conversar!
Uma cerveja no bar mais próximo
Batatas fritas, cebola e sal
Como nos velhos tempos, ótimo!
Não se feche pensando no mal
A vida é difícil, sei como é
O trabalho é necessário
Não atropele o tempo
De sua evolução
Mesmo que desacreditem
Acredite em você!
Por você, por seus amigos
Por sua esposa e filho
Respeite cada segundo de seu dia
Não torre-os com o que lhe assombra
Cure-se da agonia
De se sentir um homem sem honra
Venha cá, vamos conversar!
A situação está difícil
Mas valorize-a
Ela lhe trará bons frutos
É só você acreditar...
Foco no trabalho ao trabalhar
Foco na vida ao sair dele
Foco na família todo tempo
Foco no sorriso a vida toda...

29 agosto, 2013

Chance

Oi, moço!
Tenho que chamá-lo de senhor?
Está certo, desculpe-me.
É para eu dizer meu nome?
Meu nome não faz muita diferença
Acredite em mim!
Nem eu sei meu nome
Alguns me chamam de pretinho
Ou até de ladrãozinho
Outros, nem me chamam
Agradeço por me ver chegar
E não correr de mim
Normalmente, é assim que acontece
Devo ter treze anos
Não tenho currículo
Mas tenho experiência
Moro num cubículo
Sou mais uma vítima
Da ineficiência
Do que me prometeu o bem
Sempre vejo violência
Vidas que vão, vidas que vêm
E eu, continuo aqui
Ontem vi alguém dizer amém
Enquanto meu pai ia para o além
Tráfico de drogas
Não teve chance na vida
Não quero ter o mesmo fim dele
Por isso estou aqui
Sei que ainda sou novo
Para trabalhar com o senhor
Mas não vejo outra alternativa
Fui expulso da escola
Por roubar comida
Cinquenta anos da diretora
Não dá metade da minha vida
Não tenho brinquedos
Antes de morrer
Meu pai ia me dar um
De ferro, até brilhava!
Contava os dias
Para os meus dezoito anos
Hoje não penso mais nisso
Só quero uma chance
A chance que o senhor pode me dar
Se acreditar na criança aqui
Já ouvi dizerem que
Homem se resume por idade
Outros querem mostrar que são
Fazendo maldade
Já roubei, mas nunca matei!
Roubei de fome
Quando vou dormir
Sobre um pedaço de papelão
Quando tenho vergonha
De voltar para casa
Penso no que estou me tornando
A deixo preocupada
Não aviso onde estou
Mas lembro que nem meu nome sei
Agia como mandava a lei
Perdi tudo
Meu maior presente
Foi um pão crocante com rosbife
Que veio dentro da lancheira
Do menino de pai médico
Eu mesmo me dei
Oh! Quem não conhece a guerra
A julga por não saber como ela é
Deve ser fácil falar da guerra
Estando em paz
Na guerra, não temos tempo
Para pensar
Só temos tempo para agir
Se não agirmos
Boom! Preciso dizer mais?
Mas preciso mudar
Como eu disse
Não quero terminar como meu pai
Minha mãe? Oh! Minha mãe...
Nem sabe o que já fiz...
Quero dar um sorriso
Àquela rainha
E se me der este emprego
Eu vou conseguir!
E aí, o que me diz?
Vai me ligar em três dias?
Como assim? Não tenho celular!
Nem mexer nisso sei
Bom, em dois dias
Darei meu número de contato
Não tenho como comprar
Mas darei um jeito
Se for pelo emprego
Vai valer a pena
Pode marcar! Em dois dias
Terei um celular
Se for pelo emprego
Valerá a pena
Mais uma vez... Apenas mais uma vez...